Como Ajudar sua Comunidade a Implantar Práticas Integrativas utilizando as PICS no SUS

Saiba como incluir as PICS no SUS da sua cidade e transformar o cuidado em saúde com fitoterapia, meditação, auriculoterapia e outras práticas naturais.

Um SUS mais humano e integral começa pela mobilização comunitária e pela valorização das práticas tradicionais de cuidado

Você já ouviu falar em Reiki no posto de saúde? Ou em grupos de meditação guiada dentro da UBS? E que tal tratamento com argila, plantas medicinais e escuta terapêutica oferecidos gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde?

Sim, isso já é realidade em muitas cidades brasileiras graças às Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PICS), reconhecidas e regulamentadas pelo Ministério da Saúde. Essas práticas são uma resposta concreta à necessidade de um cuidado mais humanizado, preventivo e conectado aos saberes populares e ancestrais.

Este artigo é um guia completo para quem deseja implantar ou fortalecer as PICS no SUS da sua comunidade, entendendo o que são, por que são importantes, como acessar recursos e quais os caminhos para levar essa transformação à atenção básica em saúde.

O que são as PICS?

Um olhar ampliado para a saúde

As Práticas Integrativas e Complementares em Saúde são abordagens terapêuticas que consideram o ser humano em sua totalidade, corpo, mente, emoções, espiritualidade e relação com o meio ambiente. São práticas baseadas na escuta, no vínculo e na autonomia do cuidado.

Elas incluem desde técnicas milenares da medicina tradicional chinesa até saberes indígenas, práticas de cura africanas e abordagens contemporâneas como a terapia comunitária integrativa.

Reconhecimento oficial das PICS: 29 práticas que promovem cuidado integral no SUS

Em 2006, o Ministério da Saúde deu um passo histórico ao instituir a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PNPIC), abrindo espaço para um modelo de cuidado mais humano, integral e respeitoso aos saberes tradicionais e terapias naturais. De lá para cá, o número de práticas oficialmente reconhecidas cresceu de 5 para 29 abordagens terapêuticas, que hoje compõem o rol de ações possíveis dentro do SUS.

Essas Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PICS) são utilizadas para promover o bem-estar, prevenir adoecimentos e complementar tratamentos clínicos, respeitando a pluralidade de culturas e saberes do povo brasileiro.

A seguir, conheça algumas das principais práticas já reconhecidas oficialmente:

Fitoterapia

Uso de plantas medicinais com comprovação científica ou tradicional para prevenção e cuidado da saúde. Inclui chás, pomadas, tinturas e outros preparados, muitas vezes cultivados nas chamadas Farmácias Vivas.

Homeopatia

Sistema terapêutico baseado na ideia de que “o semelhante cura o semelhante”, utilizando substâncias altamente diluídas para estimular o equilíbrio natural do organismo.

Reiki

Técnica de origem japonesa em que o terapeuta canaliza energia vital universal através das mãos, promovendo relaxamento profundo e equilíbrio físico, emocional e espiritual.

Auriculoterapia

Forma de acupuntura que atua por meio da estimulação de pontos na orelha, ligados a diferentes órgãos e funções corporais. Pode usar sementes, agulhas ou esferas magnéticas.

Acupuntura

Técnica milenar da Medicina Tradicional Chinesa que estimula pontos específicos do corpo com agulhas, tratando dores, distúrbios emocionais e desequilíbrios energéticos.

Meditação

Prática de foco mental e respiração consciente que ajuda a reduzir o estresse, ansiedade e melhorar o bem-estar, utilizada amplamente na saúde mental e no apoio a doenças crônicas.

Yoga

Antigo sistema indiano que integra posturas físicas (ásanas), respiração (pránáyáma) e meditação, promovendo saúde integral, força, equilíbrio e clareza mental.

Terapia Comunitária Integrativa

Metodologia de escuta em grupo que fortalece vínculos comunitários e promove saúde emocional, trabalhando com a valorização da experiência coletiva e da cultura popular.

Arteterapia

Uso de expressões artísticas como pintura, desenho, escultura ou música como instrumento de autoconhecimento, expressão emocional e processo terapêutico.

Biodança

Sistema de integração humana que utiliza movimento corporal, música e vivências em grupo para estimular a afetividade, a alegria de viver e a saúde emocional.

Constelação Familiar

Técnica terapêutica que investiga dinâmicas ocultas nos sistemas familiares, trazendo à luz padrões inconscientes que podem influenciar doenças, conflitos e decisões de vida.

Aromaterapia

Uso de óleos essenciais extraídos de plantas para promover equilíbrio físico e emocional por meio do olfato ou aplicação tópica. Atua em questões como insônia, ansiedade e dores.

Apiterapia

Terapia que utiliza produtos das abelhas — como mel, própolis, pólen e apitoxina (veneno da abelha) — como agentes de promoção da saúde e fortalecimento imunológico.

Geoterapia

Uso de argilas e elementos minerais naturais em aplicações externas (como cataplasmas, banhos ou máscaras) para desintoxicação, alívio de dores e equilíbrio energético.

Cromoterapia

Terapia que utiliza as cores da luz visível para estimular centros energéticos (chakras) e promover equilíbrio físico e emocional. Pode ser aplicada com lâmpadas, tecidos ou visualização.

Essas práticas são reconhecidas por sua eficácia clínica e respaldo tradicional, muitas delas com base em pesquisas científicas e validação pelo uso histórico popular. São seguras, acessíveis e complementares à medicina convencional, oferecendo caminhos reais de promoção da saúde com foco no cuidado integral.

Hoje, as PICS estão presentes em Unidades Básicas de Saúde (UBS), Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), hospital-dia e outros equipamentos do SUS, ampliando as possibilidades terapêuticas para quem mais precisa.

Cuidar pode ser natural, integrativo e coletivo

Ao reconhecer essas práticas, o SUS valoriza saberes ancestrais, fomenta a autonomia dos territórios e aproxima a saúde das pessoas e da natureza. Cuidar da saúde não precisa ser apenas tratar a doença, pode ser cultivar bem-estar, vínculo, acolhimento e reconexão.

Por que implantar as PICS na sua comunidade?

Redução de medicamentos e medicalização excessiva

As PICS ajudam a reduzir o uso desnecessário de psicotrópicos, analgésicos e anti-inflamatórios, promovendo alívio de sintomas físicos e emocionais com práticas naturais, muitas vezes sem efeitos colaterais.

Promoção da autonomia e do autocuidado

Ao aprender técnicas como escalda-pés, automassagem, respiração consciente ou uso de plantas medicinais, a população reassume o protagonismo sobre sua saúde, o que fortalece a prevenção e a qualidade de vida.

Resgate de saberes ancestrais

As PICS valorizam o conhecimento das parteiras, rezadeiras, benzedeiras e curandeiros, reconhecendo a importância da cultura popular no cuidado com a saúde.

Fortalecimento da saúde pública

As UBSs que oferecem PICS têm maior vínculo com a comunidade, maior adesão a tratamentos e menor número de internações por causas evitáveis, segundo estudos do Ministério da Saúde.

Como iniciar a implantação das PICS no seu território?

Etapa 1: Sensibilização e informação

Promova rodas de conversa

Reúna profissionais da saúde, usuários do SUS, terapeutas locais e lideranças comunitárias para apresentar o que são as PICS, compartilhar experiências e abrir espaço para escuta.

Busque apoio institucional

Converse com a coordenação da unidade de saúde, com os gestores municipais e com o Conselho Municipal de Saúde. Mostre os benefícios das PICS e apresente materiais do Ministério da Saúde.

Etapa 2: Levantamento de demandas e recursos

Diagnóstico comunitário

Mapeie quais são os principais problemas de saúde do território (ex: dores crônicas, ansiedade, hipertensão) e quais práticas podem ajudar a aliviar esses sintomas.

Identificação de saberes locais

Valorize quem já pratica cuidados naturais no bairro. Parteiras, benzedeiras, terapeutas, líderes espirituais e professores de yoga podem ser grandes aliados no processo de implantação.

Mapeamento de terapeutas integrativos

Busque profissionais habilitados em práticas reconhecidas. O SUS exige que as práticas sejam conduzidas por terapeutas formados e, em alguns casos, com registro profissional.

Quais caminhos para implantar as PICS oficialmente?

Via equipe de saúde da família

A inserção das PICS pode ser feita por profissionais da própria UBS (médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, psicólogos, educadores físicos) que tenham formação complementar em uma ou mais práticas.

Exemplo: um enfermeiro pode oferecer auriculoterapia ou Reiki no acolhimento dos pacientes, desde que esteja qualificado.

Via parcerias com terapeutas externos

O município pode contratar ou firmar parcerias com terapeutas locais habilitados, por meio de projetos comunitários, editais públicos ou serviços voluntários regulares.

Via políticas municipais e conselhos de saúde

Cidades como Recife, Florianópolis, Goiânia, Campinas e São Paulo já têm políticas municipais de PICS. Isso garante orçamento, reconhecimento e continuidade das práticas. É possível propor uma política local com apoio do Conselho Municipal de Saúde.

Como manter a continuidade e qualidade das práticas?

Formação permanente

Promova oficinas, cursos e trocas entre profissionais para aprofundar o conhecimento em práticas integrativas. As Escolas de Saúde Pública dos estados podem oferecer apoio.

Avaliação participativa

Inclua usuários e terapeutas na avaliação dos impactos. Crie mecanismos simples como rodas de escuta, questionários e mural de feedback.

Articulação com a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS)

As PICS podem ser articuladas com CAPS, Centros de Convivência, CRAS e escolas. Isso fortalece o cuidado intersetorial e integral.

Exemplos inspiradores pelo Brasil

São Paulo (SP)

A cidade possui mais de 100 UBS oferecendo práticas como meditação, yoga, auriculoterapia e fitoterapia. O programa municipal de PICS inclui capacitação de profissionais e hortas medicinais em unidades de saúde.

Chapada do Araripe (CE)

O município de Barbalha implantou Farmácia Viva dentro do SUS, com plantio, preparo e distribuição de fitoterápicos regulados pela Anvisa. A experiência é referência nacional.

Florianópolis (SC)

A capital catarinense é pioneira na institucionalização das PICS com política pública específica, equipe técnica dedicada e articulação com universidades e comunidades tradicionais.

Quais são os desafios enfrentados?

Falta de formação e apoio institucional

Muitos profissionais ainda desconhecem as PICS ou têm receio de incluí-las por medo de não serem reconhecidas. É fundamental formar equipes multiprofissionais e sensibilizar a gestão.

Resistência de parte da comunidade

Algumas pessoas podem associar as práticas a religiões específicas ou duvidar de sua eficácia. A informação correta e a demonstração dos resultados são as melhores estratégias para superar barreiras.

Falta de orçamento específico

Sem políticas públicas municipais, muitas vezes os serviços de PICS dependem da boa vontade de profissionais voluntários. Por isso, a luta por institucionalização é essencial.

O SUS que queremos nasce do cuidado com raízes profundas

Implantar as PICS no SUS é mais do que oferecer práticas diferentes. É transformar o modelo de saúde em algo mais humano, acessível, respeitoso e conectado com a cultura de cada povo.

Como bióloga e naturopata, acredito profundamente que saúde é vínculo, é cuidado partilhado, é resgate do que nossos avós sabiam. Quando incluímos as PICS no SUS, não apenas tratamos sintomas,  re-conectamos pessoas à sua história, ao seu corpo e ao seu território.

Se na sua cidade ainda não há práticas integrativas no SUS, que este texto seja o início de uma mobilização. Reúna, sonhe, plante, proponha. Porque saúde é também participação e cada um de nós pode ser semente dessa mudança.


Nota de responsabilidade:

Este artigo tem caráter educativo e informativo. A implantação das PICS no SUS deve seguir as diretrizes do Ministério da Saúde e normas dos Conselhos de Saúde locais. Consulte sempre profissionais qualificados e órgãos oficiais antes de realizar qualquer prática.